Fogo, o maior símbolo da
ascensão do Homo sapiens foi a primeira fonte de energia por nós controlada. Tal feito, é até hoje rememorado nas mais diversas narrativas humanas, da cultura pop aos mitos religiosos espalhados pelo mundo. Em A Origem da Espécie,
o escritor Alberto Mussa,
compila e analisa centenas de mitos sobre a “origem do fogo”, onde defende a ideia de que todos esses mitos são oriundos de um mesmo protomito
narrado originalmente milhares de anos atrás.
Aqui devemos ter bastante
cuidado: primeiro, Mussa não é etnologista e se envereda por um campo nebuloso, onde
antropólogos e arqueólogos têm pouco acesso devido à escassez de dados brutos,
falar da pré-história é sempre muito especulativo. Segundo, Mussa se utiliza de
toda uma aritmética estranha e meio infundada para tentar comparar os vários
mitos. Ao considerar por exemplo “o mito tupinambá sobre o fogo” como único, descarta a possibilidade de existirem outros, um único mito compilado ou o único que se teve acesso, é sempre menor que o número original. Além disso a
justificativa do isolamento dos povos pela língua embora válida, simplifica
demais um cenário muito mais complexo, é praticamente impossível descartar a
possibilidade de que esses mitos tenham sido reinventados e compartilhados
milhares de vezes ao longo da jornada humana. Todavia, passado o
pântano aritmético das primeiras páginas e alguns rodeios argumentativos
nebulosos, o resultado final a partir de onde Mussa se propõe divagar é convincente: o mito sobre o fogo existe em praticamente todas as regiões do
mundo, incluindo em povos isolados, onde o tema mais recorrente é o roubo
desse fogo e quase sempre temos animais participando dessas histórias.
Mussa não chega a
conclusão sozinho, se baseia num bom repertório bibliográfico de diversos
especialistas sobre o tema e o retrato da pré-história que discute é crível e
instigante: fala sobre tribos de várias espécies que batalhavam
constantemente pela posse do fogo, de forma que os mitos que nós conhecemos
devem ser ancestrais à essa época. Esses mitos estariam relacionados diretamente com as primeiras alianças forjadas entre as tribos e explicaria conceitos básicos de família, tabus e sociedade. Mussa vai ainda mais longe, como os mitos carregam toda uma noção da cosmologia, seria também o embrião do xamanismo como expressão religiosa. Num mundo onde a linguagem era a fronteira que separava as tribos, os mitos sobre o fogo teriam sido ao mesmo tempo: fábulas, religião e norma.
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